quarta-feira, 21 de abril de 2004

A ética dos totalitários

Um traço comum dos fanáticos e totalitários é não
somente a certeza em algum plano para mudar o mundo, mas o desejo de cometer
todos os atos necessários para fazê-lo. Pior do que isso, chegam
em tal ponto em que qualquer forma de moralidade, religiosa ou baseada em senso
comum, é rechaçada como um obstáculo a ser transposto,
servindo tão somente como objeto de manipulação. A única
medida de certo e errado torna-se o quanto um fato ajuda a causa. Bem e mal
passam a ter sentido somente quando em relação aos objetivos do
plano de mudança de mundo. Por essa estrada caminham os apologistas de
genocídio e outras brutalidades. Um crime cometido em nome da causa,
por pior que seja, é aceitável, e até objeto de adulação,
quando possível, ou negação, quando imperativo. Já
um ato intrinsecamente bom, quando prejudica a causa, deve ser criticado da
maneira mais virulenta possível. Para adequar a realidade aos interesses
totalitários, qualquer método é válido. Uma mentira
que ajude é boa, uma verdade que prejudique é ruim.


Podemos imaginar seguinte cenário: um ditador totalitário brutal
prende, tortura e executa dissidentes, controla a imprensa e um séqüito
de seguidores que se enriquecem às custas da opressão do povo.
Para a moralidade comum, isso é errado. Já para um totalitário,
o que antes deve ser examinado é a ideologia do tal ditador. Se for a
mesma que a sua, então: a) Ele não fez nada disso, é tudo
mentira de agentes contrários à ideologia; ou b) Ele tinha mesmo
que fazer tudo isso; ou uma mistura entre ambos. Tanto faz que oscilar entre
mentir e negar os crimes e justificá-los seja contraditório. O
importante é manter a defesa da causa.


Atos tais como impor uma ditadura, prender e torturar dissidentes, ou oprimir
o povo não são por si só reprováveis para a ética
dos totalitários. São neutros, assim como mandar ajuda humanitária
para uma população faminta. Se ajudar a causa, os totalitários
serão a favor de uma ditadura brutal e contra a ajuda humanitária.
Note-se bem que, caso o líder de um país seja contrário
a sua causa, o totalitário irá execrá-lo da mesma maneira.
Uma democracia contrária à causa deve ser atacada tal como uma
ditadura. Uma ditadura favorável deve ser elogiada tal como a mais bela
democracia.


Quando alguém está disposto a cometer qualquer atrocidade em
favor de um plano para mudar o mundo, apagam-se as fronteiras entre ideologia
política e religião: ambas fundem-se numa só. A ideologia
totalitária transforma em uma religião para seguidores fanatizados,
e a religião fundamentalista vira verdadeira ideologia política.
Esse traço comum foi bem estudado por Eric Voegelin. A mente fanatizada
não aceita nenhum questionamento, e vê qualquer obstáculo
ético ou moral como uma invenção maligna do inimigo para
impedir a realização do plano maior. A certeza é tamanha
que não há crime grave demais que não possa ser cometido
em favor da causa. Claro que, compreendendo que nem todos pensam como eles,
sempre que necessário tentarão esconder sua opinião e desejos
sobre uma cobertura de mentiras e enganações com o propósito
de manipular a moralidade comum.

terça-feira, 20 de abril de 2004

Robin Hood e os impostos

Um grande engano do mundo atual é a insensibilidade ao aspecto da coercitividade.
Claro que existe uma responsabilidade moral de ajudar uns aos outros, mas não
na marra. Não existe caridade ou fraternidade à força,
sob peso do poder e violência do Estado. De qualquer modo, como se sabe,
a "ajuda" acaba sendo dissolvida na burocracia e ineficiência
e apenas atrapalha, sugando recursos preciosos da sociedade.


Robin Hood não era aquele que "rouba dos ricos para dar as pobres"?
Mas, pensando bem, era o xerife de Nottingham que cobrava impostos extorsivos
da população. O que o Robin fazia era pegar a grana e devolver
aos seus legítimos donos. Claro que é mais catchy que
"aquele que rouba dos coletores de impostos para devolver aos pobres"
.


Não adianta tentar jogar nobres intenções sobre a sanha
tributária do xerife de Nottingham. Na falta de um Robin Hood, o governo
fica com quase metade da riqueza do país.