quarta-feira, 16 de março de 2005

O Cristianismo e o Naturalismo

O chamado materialismo cientifico, base do ateísmo moderno, na verdade tem uma natureza de crença. Note-se que não exatamente religião, pois o objetivo não é ligar nada, mas em um conjunto de presunções dogmáticas não-observáveis.


Senão vejamos. O que é sagrado para um materialista? No que ele deveria, digamos, fazer seu juramento num tribunal, como em filmes? Decerto não numa Bíblia. Um biólogo celebre afirmou que o darwinismo permitia que fosse um ateu intelectualmente completo. Talvez devesse jurar com as mãos sobre “A Origem das Espécies”, de Darwin? O Sagan por vez defendeu que acreditava somente nas leis da física, mas que não faria sentido rezar para elas.


O cerne desse pensamento, portanto, é que apenas existe o que é material. Apenas o cientificamente verificável pode ser admitido como real. Desse modo, a ciência determina o que é real, de modo absoluto. Essa crença é a de que o universo físico é tudo que existe. Não existe nada fora dele. Onipresença.


Deve-se notar, claro, que, dentro do universo científico, essa presunção é valida. É claro que só pode ser um fato científico aquilo que é cientificamente verificável. Mas daí a saltar que qualquer coisa, para ser real, em qualquer nível, tenha que ser testável, falseável e verificável é um salto tremendo.


Não existe nada fora do universo que tenha a força, ou o poder, de causar algum efeito. Todo o poder que existe está contido no próprio universo. Onipotência.


Inexiste um lugar não físico onde ficam as idéias ou a moralidade. O universo das idéias, lugar onde as linguagem e os conhecimentos ficariam, é uma abstração. Portanto, todo o conhecimento está contido no próprio universo. Onisciência.


Onipresença, Onipotência e Onisciência. Temos aqui três características associadas ao Deus do cristianismo. O naturalismo, aqui, toma contornos de panteísmo. Mas o deus do panteísmo é completamente diferente. Trata-se apenas do universo que contém tudo que, acreditam eles, existe.


Obviamente, não existe nenhuma prova de que apenas que tudo que exista seja restrito ao que for que pode ser comprovado cientificamente. É um raciocínio circular. A ciência apenas pode provar que certas coisas existem. Logo, as outras não podem ser comprovadas cientificamente. Pular daí para que apenas o que possa ser comprovado cientificamente existe é um salto puramente dogmático, sem base em nenhuma prova. Não é uma afirmação cientifica, mas filosófica.


Claro que eles tem o direito de fazer essa afirmativa. Mas não de dar a ela o peso de um fato científico que não tem, de modo algum. Não se deve confundir a ciência como método de acumular conhecimento com o naturalismo, que é uma cosmovisão baseada em crenças e dogmas.


O materialismo pode ser necessário á ciência empírica. Mas não às outras formas de conhecimento humano. Torná-lo axioma único do pensamento humano é querer que uma forma de conhecimento tenha o poder de determinar absolutamente as demais. Não é uma atitude cientifica, mas filosófica. Não é uma proposição falseável.


Diferença Ontológica


Os materialistas afirmam que não existe prova cientifica e falseável do cristianismo. Como se isso fosse uma grande acusação. Reclamam que não podem pegar os dogmas cristãos, e testá-los em laboratório. Ora, os cristãos concordam. Até onde sabemos, não existe, não pode existir e provavelmente seria uma heresia tentar falsear o cristianismo em laboratório. Dentro da teologia cristã, é risível a idéia que do homem achar que pode compreender Deus e testá-Lo em laboratório. Não é outro o pré-requisito de muitos ateus para acreditar em Deus. Obviamente, não sabem que fé é justamente acreditar sem ver.


Não que não tenham fé. É claro. Esse naturalismo panteísta pode muito bem ser uma vertente majoritária, mesmo que inconsciente, do pensamento ateu moderno. Trata-se de um conjunto de crenças que inclui o absolutismo da ciência empírica sobre todo o conhecimento humano e toda a existência. Crêem nisso sem prova nenhuma – certamente não uma prova científica.


Afirmam que toda religião é uma superstição. Uma tentativa de explicar fenômenos que não conseguem compreender. Essa é a mais falsa das acusações.


O homem da caverna via um trovão, e passa a acreditar que era um deus do trovão. Via o Sol, a Lua, e as estrelas, e procurava compreender tudo como divindades. Era um conhecimento primitivo do universo. Claro que tanto o trovão quanto o Sol, as Lua e as Estrelas eram reais, e o homem das cavernas sabia disso.


O naturalista moderno também vê o trovão, e passa a acreditar nas leis da física que tornaram o trovão possível. Vê o Sol, a Lua e as estrelas, e procura compreender tudo dentro da astronomia. É um conhecimento complexo do universo. Substituem as divindades primitivas supersticiosas por leis da física cientificamente comprováveis. Mas se mantém uma relação similar – embora mais complexa. Assim como no caso anterior, os fenômenos são reais, porem com um conhecimento muito melhor.


Do mesmo modo que o naturalista se vê como uma versão evoluída das amebas, o panteísmo é do que uma versão evoluída do animismo primitivo.


O cristianismo é completamente diferente.


O cristão se vê como diferente dos outros animais. Existe uma diferença ontológica, uma Alma, algo que nos torna únicos. Um presente de Deus, fora das causas naturais do universo. A Alma não evoluiu, foi dada por Deus. Não faz parte do processo natural do universo.


Claro que contra este ponto se colocam os naturalistas, tentando explicar o que entendem por alma dentro pela psicologia evolutiva. Claro que tal tentativa débil apenas demonstra o quanto nem sequer tem idéia rudimentar do que seja o conceito de alma. Pois se a alma é um elemento do homem que transcende o universo material, é logicamente óbvio que não pode ser verificável pelo método científico. O constante uso do argumento de que nada existe fora do universo natural porquê não pode ser verificável por um método que, por definição, nunca terá nada a dizer sobre o tema é um falácia, um raciocínio circular gritantemente ilógico.


O cristianismo é diferente do panteísmo. Existe uma diferença ontológica, pois, frontalmente contra o que afirmam, o cristianismo não foi descoberto por pesquisa, razão, ou evolução de crenças anteriores, mas foi uma revelação de Deus. O cristianismo não faz parte do processo natural do universo.


Dois mil anos de cristianismo e nenhum cristão jamais provavelmente entendeu por completo sua própria fé. Os mistérios são muitos. Nem a Igreja Católica, nem as Igrejas Orientais, nem as protestantes, nem as antigas igrejas cristãs sabem explicar os principais mistérios da Fé. Quão menos criá-los.


Pois o naturalista não é nada mais do que uma versão extremamente complexa do homem das cavernas. Explica o universo não com divindades simples, mas sofisticadas leis da física. Mas o defeito não esta nessas acertadas leis, mas em sua relação com elas. As leis explicam verdadeiramente os fenômenos do universo natural, mas em nenhum momento indicam que este universo seja tudo que exista. Isso é um salto evolutivo da crença primitiva para a moderna.


Ambos, o homem da caverna e o panteísta, ignoram Deus. O primeiro, por impossibilidade. O segundo, por opção. Seguem, contudo, na mesma linha evolutiva, negando tudo o que foge a seu conhecimento.


O ponto aqui não é de forma alguma atacar a ciência nem como método ou sistema de compreender o universo natural. Superstição consiste no relacionamento, não o objeto em si. Os naturalistas têm uma relação supersticiosa com a ciência. Tanto o trovão quanto as leis da física são reais. Portanto nada mais razoável do que reconhecer sua existência. Diferente de dar a uma ou outra coisa um valor que extrapole sua dimensão natural e entre na esfera de crença. A denominação recai sobre a valoração exagerada de um determinado objeto, e não o objeto em si.

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