sábado, 22 de outubro de 2005

A Máscara do Herói

“Spider-Man is all but invincible, but Peter Parker, we can destroy him!” – Green Goblin, Spiderman (2002)


“People need dramatic examples to shake them out of apathy and I can’t do that as Bruce Wayne. As a man, I’m flesh and blood, I can be ignored, I can be destroyed, but as a symbol… as a symbol I can be incorruptible, I can be everlasting.” – Bruce Wayne, Batman Begins (2005)


A dinâmica entre a “identidade secreta” e o “alter ego”, embora presente em lendas e mitos, não é de todo alheia à vida comum. Comumente diferenciamos entre o “homem público” e o “homem privado”, entre a vida e família e a vida profissional. Desde bem cedo as crianças agem de modo diferente junto aos colegas na escola ou em casa com os pais. Muitas vezes esquecem-se disso quando ficam adultos e tem seus próprios filhos. Mas desde cedo a vida possui essa separação entre os diversos mundos. Muito embora esta parece aos adultos por demais trivial na idade infantil, é quando começa a existir. Talvez por isso a dinâmica de herós e identidade secreta ressone de modo tão intenso no mundo infantil, e guarde seu apelo universal.


Por vezes busca-se mitigar ou diminuir o apelo e força da vida familiar, e um exeplo disso é a norma eclesiástica para que bispos não possam se casar. Na Igreja, até hoje o celibato é a norma na Igreja de rito latino. A vida familiar é restrita de modo a tornar exclusiva à dedicação à vida religiosa.


Essa dinâmica é tangenciada no mundo dos quadrinhos, onde heróis sacrificam em grande parte sua vida privada em prol de sua ocupação de combater o mal. Os dois filmes selecionados ilustram muito bem essa questão. A vida privada não é apenas prejudicada pelo heroísmo, mas risco se abate sobre as pessoas próximas. A identidade secreta visa a proteger tais pessoas, e também ao herói. Por mais que um herói seja invencível, seu alter ego tem toda a fragilidade humana.


E funciona ao contrário, também. Ao colocar a máscara, os heróis se tornam mais do que meros homens. Como símbolo, ao menos na mente de seus oponentes, perdem sua fragilidade humana. Um bom exemplo disso é o Fantasma. Existiram vários. Individualmente, podiam ser mortos. Mas sempre havia um outro que assumia a máscara. O heróis torna-se assim imortal e incorruptível.


Qualidades cinematográficas a parte – e são discutíveis – o filme A Mascara de Zorro é um bom exemplo, a começar pelo título e premissa. Zorro, como todos sabem, é um herói invencível que facilmente derrota quaisquer forças que tentem detê-lo. Exatamente ao perceber isso, o vilão local, num insight raro, percebe que o herói pode apenas ser destruído sem a máscara. Desse modo, com uma trama descobre a identidade secreta. Dom Diego, sem a máscara, em sua casa, com sua mulher e filho sob perigo, luta nobremente mas é derrotado. Mas não é o fim de Zorro, justamente porque outro personagem, o bandido Alejandro, toma a máscara, tornando-se o novo Zorro.


Estratégia similar empreende o Duende Verde em Spider Man, ao atacar exatamente aonde o herói é mais fraco, ou seja, colocando em risco sua Tia May e a mulher de quem gosta, Mary Jane. Mesmo o vilão de Batman Begins prefere atacar seu inimigo sem máscara, em sua casa. Não apenas porque fica mais frágil, mas porque o herói não luta bem sem máscara. Bruce Wayne apanha fácil. Dom Diego pela primeira vez na vida não derrota os guardas mexicanos. Peter Parker consegue derrotar um brutamontes de colégio, mas na hora de lutar com um super-vilão, não dispensa o uniforme.


Quem leu Batman: Ano Um sabe que treino e dedicação pouco significam sozinhos. Bruce Wayne sem a roupa do Batman sai pelas ruas vestido normal para combater crimes, mas não é levado a sério, apanha e quase é morto nas duas vezes por uns poucos bandidos. No filme, tenta falar com Gordon, mas tem que sair correndo e se estabaca no chão. Bruce Wayne é só um cara esquisito andando por ai batendo em bandidos, não pode nada. Batman pode fazer muito mais. Um homem forte pode lutar contra 6, um herói pode lutar com 600. Exageros a parte, sabe-se que o mesmo sujeito vai lutar melhor se estiver de uniforme, ou se for um cavaleiro.

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